COLUNA: Por que é tão difícil nos relacionarmos? (Parte I)

By Bernardo Busch - outubro 29, 2017

foto meramente ilustrativa

Mais um dia normal, em um vagão qualquer da linha quatro.

Eu não sei o que acontece, mas a maioria das minhas reflexões pessoais começa dentro do metrô.

 Estava eu, voltando para casa, após mais um dia típico de um estudante universitário, preocupado em alternar o que sobrou das minhas forças vitais entre evitar encarar a pessoa sentada à minha frente e, de quebra, me manter acordado. Eis que um casal de amigas, sentadas ao meu lado, inicia uma conversa.

"Fala sério, não vai te custar nada mandar uma mensagem pra ele, nem um segundo".

Sim, aparentemente elas estavam discutindo sobre mandar ou não uma mensagem pro @.

Até aí, nada de atípico. Na verdade, já perdi as contas de quantas vezes já ouvi/presenciei esse tipo de discussão. Acontece que o final da frase despertou em mim -e me despertou, de certa forma- mais uma reflexão aleatória comum às sextas.

"Nem um segundo".

Se comunicar nunca foi tão fácil.

Pera, nunca foi tão rápido*

Não, nunca foi tão fácil e tão rápido.

Na verdade, não.

Vamos lá, vou me esforçar para tentar colocar um pouco de sentido nesse meu pensamento totalmente desconexo.




Desde sempre, somos seres relacionais. O nosso próprio nascimento é um ato relacional, afinal, nascemos a partir da intervenção de um outro ser humano. E por aí vai, nosso primeiro ciclo social (a família), nossos primeiros colegas da escola, nossos primeiros amigos, primeiros vizinhos, primeiras pessoas com quem nos relacionamos, colegas da faculdade, do trabalho, etc. etc. etc. Entretanto,embora tenhamos a necessidade de nos relacionar uns com os outros como característica humana fundamental, estamos sempre falhando nisso.

Repara, nos construímos a partir das nossas falhas relacionais. Aprendemos a falar depois de errar várias e várias vezes a mensagem, aprendemos a conseguir alguma coisa depois de espernear inutilmente várias e várias vezes, aprendemos a ser responsáveis depois de assim não ser várias e várias vezes, aprendemos a manter um relacionamento saudável após várias e várias tentativas fracassadas. Mas, por quê?

Remoendo todas essas ideias na minha cabeça, comecei pelo seguinte ponto: estética. Me lembrei de uma aula de filosofia na qual discutimos como a estética influencia -ou até mesmo guia- o comportamento humano. Estamos o tempo todo buscando padrões estéticos em tudo, tanto no mundo físico, digamos assim, quanto nas nossas relações com os outros. Por estética, quero dizer padrões de semelhança. Isso tem tudo a ver com as nossas falhas comunicacionais: não sabemos lidar com as diferenças.

Projetamos nos outros expectativas que são nossas, reações que seriam as nossas, pensamentos que nós teríamos. Basicamente, nos projetamos no outro. Pode não parecer, mas é difícil aceitarmos o fato de que somos sim diferentes -as pessoas tem o direito de não corresponder às nossas expectativas. Queremos o tempo todo que o outro tenha uma empatia por nós, que não temos por ninguém. Alias, foi bom falar em empatia. Talvez se, na nossa busca pessoal por felicidade, focássemos menos em nosso sucesso material/profissional e em ter tudo conforme o esperado, exercitando mais a nossa capacidade de empatia, chegássemos mais perto. Mais uma vez: a nossa felicidade não depende só de nós, mas sim da nossa autoaceitação enquanto seres diferentes e relacionais e da nossa capacidade de se colocar no lugar do próximo.

Pode parecer um clichê -e, de certo modo, é mesmo. Porém, a máxima "se coloque no lugar do próximo" é bem mais complexa. Precisamos dela para entender que o mundo existe externamente a nós. É como se cada um de nós enxergasse por uma lente; precisamos reconhecer que o outro enxerga de uma outra maneira, mesmo que seja bem parecida com a nossa. Isso é empatia. Ta, mas o que isso tem a ver?

Tudo.

Todos os nosso problemas começam aí. Queremos ter o mesmo corpo, o mesmo estilo de vida, o mesmo sucesso, as mesmas pessoas, as mesmas opiniões, os mesmos objetos, as mesmas viagens, as mesmas relações, a mesma felicidade.

Recapitulando a conversa das meninas. Por que temos tanto medo de mandar uma mensagem para o nosso interesse amoroso -vamos apelidar assim-? Simplesmente porque, no fundo, sabemos que o outro pode não corresponder exatamente como nós queremos/esperamos. E qual é o problema?

Temos medo de sermos julgados justamente por sermos diferentes. Meninas que mandam a primeira mensagem para o cara? Atiradas. Chamar no dia seguinte? Desespero. Visualizar e logo responder? Afobação. Mais uma vez a nossa mania de agrupar tudo e todos. Somos mais do que comportamento de massa, galera.

Por isso é tão difícil se relacionar nos dias de hoje. A mensagem chega instantaneamente, mas sem conteúdo. Nos preocupamos em aparentar ser alguma coisa, ao invés de ser alguma coisa. Assim, não somos sinceros, não assumimos as nossas diferenças e fazemos de tudo uma grande perda de tempo.

Não seria muito mais fácil mandar a mensagem, conversar e descobrir se aquela pessoa de fato tem algum interesse por você?

 Claro que não. Assim é fácil demais.

Quando mais fácil tornarmos a comunicação, mais difícil tornamos as relações. Não gostamos de deixar as coisas claras, pois temos medo de quebrar padrões de semelhança que só existem na nossa cabeça.

Preferimos o benefício da dúvida, afinal, desse modo ainda podemos alimentar as nossas expectativas de que o outro corresponderá exatamente como queremos. Mas, pasme: ele não vai. Mesmo que a pessoa queira algo com você -o que é ótimo-, não vai ser do seu jeito, não vai ser no seu tempo, não vai ser controlado por você.

Então manda a porcaria da mensagem.

Procura aquela pessoa que fez algo pra você e até hoje você não falou sobre isso com ela. Manda aquela mensagem p/ @ que você queria mandar há séculos. Tira aquela história a limpo. Peça desculpas pra alguém que você eventualmente machucou nesse jogo de expectativas. Saia daquele relacionamento que você sabe que não vai pra frente simplesmente porque você NÃO vai mudar o outro.

As nossas mudanças veem de nós, não dos outros.

Vamos parar de ter medo e conversar sobre as nossas individualidades. Talvez assim possamos entender melhor o mundo -e a nós. Não é vergonha nenhuma querer alguma coisa com alguém e não ser correspondido. Vergonha é projetar as nossas faltas e necessidades pessoais em cima do outro.Ninguém tem a obrigação de satisfazer os seus desejos pessoais, somente você mesmo.

Se você não mandar a mensagem, nunca vai saber se vai dar certo.




(continua)

















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1 comentários

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